domingo, 30 de dezembro de 2007

Mais um ano que passa

Olha eu aqui de novo, duas semanas seguidas.
É possível que você esteja pensando "Lá vem ele de novo com uma desculpa pronta para não ter escrito nada, deixando o blogue de lado mais uma semana". Mas acredite, não há vestibular como desculpa e não conheço outro sociólogo que possa usar como justificativa.
Foi por isso que ontem comecei a escrever uma crônica. Poderia tê-la terminado, mas acho que ficaria ruim. Ainda assim precisava postar alguma coisa, pois minha ausência em sequência já estava ficando chata.
Então resolvi fazer o seguinte, mesmo que seja precipitado.
Postei abaixo o que espero que venha a ser o primeiro capítulo, ou talvez o prólogo, do romance que citei semana passada. Não sei se será possível completá-lo, verei conforme a história avança, mas de qualquer forma resolvi que poderia fazer algo relativamente novo...
Conforme escrevo, postarei aqui e peço que, caso haja alguma sugestão/crítica/qualquer outra coisa, vocês a façam pelos comentários, mesmo que seja algo ruim ou correção gramatical.

Postei essa semana, mas tenho já a desculpa pronta para as próximas. Viajarei em janeiro e não sei se será possível postar um texto por semana. Vou tentar deixar algo pronto para os outros postarem, mas não sei ainda se será possível.

Enfim, feliz 2008, para mim e para vocês.
E, por que não, que o Hipóbole continue assim, não no ritmo de dezembro, mas no de outubro/novembro.

Prólogo

“Mas como foi a sessão de fotos? Você ficou nervosa?”

“Claro... Foi o meu primeiro ensaio, então o nervosismo era natural, sabe, com tantas pessoas me olhando. Mas correu tudo bem; a equipe era ótima e o fotógrafo extremamente profissional...”

Ainda que inédita, a matéria soava repetitiva para o repórter. Já havia, em diversas oportunidades, entrevistado ex-participantes do Big Brother que estampavam capas de revistas masculinas. Mas não é nisso em que consiste sua profissão? Basicamente, vasculhar o mundo das celebridades televisas atrás de notícias bombásticas e, não as conseguindo, extrair algumas palavras de quem não tem nada a dizer. Não se orgulhava do emprego, mas era isso que lhe dava dinheiro, bastante por sinal, e garantia sua fama.

Para que os quatro anos estudando jornalismo se não sentia prazer ao escrever, e menos ainda ao ler sua revista? De que lhe valia a erudição acumulada se grande parte dos leitores e dos personagens de suas matérias não sabiam o significado da palavra? Só o que sabia é que, caso morresse naquele momento, não teria morrido feliz.

De qualquer forma, seria injusto dizer que não era bom no que fazia. Toda semana publicava matérias que provocavam exclamações de surpresa nas donas de casa que, ao irem comprar pão, paravam diante das revistas expostas na banca de jornais. Até mesmo aquela entrevista, sem conteúdo algum e por ele desprezada, conseguiria a capa caso ninguém famoso se casasse ou se separasse naquela semana. Por mais que a razão lhe fosse oculta, a maioria da população interessava-se por aquelas banalidades da mídia, desde que tivessem sido escritas ou comentadas por ele, o mais temido e respeitado repórter de fofocas, o herói dos paparazzi, o guru das domésticas.

E pensar que, quando jovem, interessava-se por Política e História... O que queria era estar numa Universidade discutindo filosofia, e não na sala de estar de alguém que devia sua fama a um reality show. Sonhava em publicar ensaios sobre a situação do país ou, por que não, sobre o ateísmo que defendia até mesmo de forma irracional antes de vender-se àquela revista de fofocas. Mas quem os leria? A parcela da população que lê seu trabalho não se interessa por tais assuntos e a parcela que se interessa nunca leria algo seu, senão na sala de espera do dentista.

Enfim, não dispunha de tempo para questionar-se sobre algo tão fútil quanto os rumos que sua vida havia tomado. Tinha uma entrevista por fazer e aprendera, após anos em sua profissão, que pensar não era algo produtivo.

“E os projetos de trabalho agora que saiu da casa mais famosa do país... Como estão?”

Algumas vezes se indagava o porquê de perguntas tão idiotas. Não era preciso ter toda sua experiência para saber a resposta daquela. Meia dúzia de campanhas publicitárias e, talvez, uma oportunidade de emprego na próxima novela das seis, algo de que seus contratantes logo se arrependeriam. Depois disso, o ostracismo.

Dessa vez, no entanto, não ouviria o que aquele ela julgava ter a dizer... Sentiu uma dor lacinante no coração e viu o ambiente ao seu redor escurecer.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Caderno de um poeta

Folhas amassadas e magoadas
Rasuras infinitas
Idéias cruas e inacabadas
Anotações benditas

Zombaria d’uma caneta falhada
Mentiras desvairadas
Eu-lírico de lástima exagerada
Lágrimas derramadas

Pérolas a porcos, precipitadas
Mil balas de safira
Esmeraldas a Afrodite, jogadas
A reviravolta e vira

Lirismo comedido ou espatifado
Tudo espalhado

Aristocrático

Sorria, sorria sempre
Desventura emocional?
Ninguém se importa
O mundo é superficial

Esteja sempre bonita
O apego é material
Conteúdo? Pra quê?
O mundo é superficial

Problemas? Que problemas?
O mundo não quer saber
Por isso, sofra em silêncio
Não deixe ninguém perceber

Genial! Ou não... (7ª edição)

Sim, postando na sexta ^^ Espero que o Natal de todos seja maravilhoso. Espero, obviamente, que o Ano Novo de todos também o seja.

Essa semana foi frutífera para reflexões – diversos temas foram abordados na minha cabeça e três deles viraram poemas (mas acredito que o terceiro seja demasiadamente pessoal para que possa postá-lo sem preocupações). Mas essa semana descobri algo: não basta somente a inspiração inicial na construção de um poema, mas também tempo para trabalhá-lo. Isso pode parecer óbvio e sem-graça, mas me intriguei a beça com isso. Devo ter uns 20 poemas e nunca percebi? Como assim?
Pois é. Porque essa semana foi cheia de fontes de inspiração no meio do caminho (no ônibus, que é meu local favorito para escrever, atualmente), o que me fez ter poemas pendentes (!!), que tinham buracos para versos e versos mais ou menos, que foram substituídos logo após. Dos meus pendentes, ainda me restou um.
Algo também chamou a atenção de um jeito brusco: os parques da cidade do Rio de Janeiro. Nessa semana, fiz um passeio com meu tio, sob o sol de 40 graus pelo Jardim Botânico e pela Lagoa. Claro que sempre quando faço um passeio desses, me impressiono com a beleza da cidade, que é algo aceitado bem no consciente de todos e supostamente, bem óbvio. Mas andando pelos lugares bonitos da cidade (que de forma alguma não se resumem aos que citei), descobre-se que não é nada óbvio, não é previsível. Descobre-se que esses lugares tem uma magia, uma personalidade própria e um humor que os torna dignos de muito mais que uma visita por ano.

Hum... recomendações? Nenhuma por essa semana, além de um bom champanhe!
Até qualquer dia da semana que vem

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

Muitas semanas que passam

Bom, já passaram muitas semanas, perdi a conta.
De qualquer forma, estou aqui para pedir desculpa pelo longo tempo sem escrever, não só a quem lê nosso sítio, mas também aos outros colunistas (embora seja estranho chamar meus amigos, simplesmente, de outros colunistas).
Enfim, a culpa é minha, não vou mentir, mas não só. O grande culpado é Domenico de Masi, um sociólogo italiano, teórico da sociedade pós-industrial. Você deve estar se perguntando o porquê... Talvez não, mas devo uma história e vou contar essa mesmo.
No final de novembro li um texto sobre a teoria de de Masi, chamada por ele de ócio criativo. Segundo ele, seria possível, numa sociedade pós-industrial, que trabalhássemos menos e apenas com aquilo que agradasse. Basicamente, ele tenta nos convencer de que o ócio faria bem ao homem e o tornaria mais criativo.
Fiquei feliz ao ler essa utopia, afinal estava prestes a entrar de férias... Ora, férias, para alguém que acaba de concluir o ensino médio, significa ócio e ócio, segundo o italiano aumenta a criatividade.
O tempo passou, o vestibular terminou e fiquei decepcionado. Domenico de Masi me mentiu. Me deu uma falsa esperança. O ócio definitivamente não fez bem a minha criatividade, ainda não produzi praticamente nada nessas férias.
Foi assim que comprovei que ócio, tudo que ele produz é... Ainda mais ócio. A atividade constante é que leva à criatividade.
(Gostaria de lembrar que isso é uma brincadeira apenas. Se você concorda com a teoria do ócio criativo, não pense que a estou insultando.)


Continuando...
Peço desculpa por estar postando numa segunda, mas foi quando eu consegui escrever algo e falta muito para domingo.
Por último, gostaria de dizer que esse período não foi de completa inatividade na escrita. Estou trabalhando em dois possíveis projetos, uma série de contos minimalistas e um romance. Não publiquei nada deles porque estou esperando que eles tormem formas mais concretas, de forma que eu não comece a postar e deixe pela metade.
Feliz natal e até breve.

(Propaganda) Um colega meu pediu que colocasse aqui um link para seu blog recém-criado. Lerei agora, pra ver como está. Se você não tiver nada pra fazer, fica a sugestão.

domingo, 23 de dezembro de 2007

A Esperança

A Esperança


Dos céus desciam raios de luz, banhando a vasta e incompreendida gama de formas de vida.Os pedestres seguiam seus rumos, como se fosse possível ignorar os demais à sua volta.
É muito fácil demonstrar desprezo e pouco caso quando o conforto é certo.Mas mesmo os que sabem disso possuem um vício doentio em buscar essa luxuria.Nada mais são do que seres frustrados, que por não serem metade do que sonhavam, crêem que não custa nada fingir.Vivem na ignorância, até mesmo do sofrimento de seus “amigos”.E assim o amor some no pulsar da cidade.Para um observador-morador tudo que sucede é natural, os homens tem o mau do orgulho em sua natureza.
A verdade (ou o mais próximo dela) é que só um observador externo é capaz de chorar de raiva por dentro, ao ver tantas criaturas tolas desperdiçando o que lhes foi dado.
Dizem não acreditar em Deus, alguns até se acham rebeldes por isso.Mas não é nenhuma surpresa, afinal a última coisa que um ser vazio de crença pode ter, é a gratidão.Ora, gratidão à que?!...A poder ler isto (mesmo que não o agrade), e ter liberdade para ler tanto mais quanto quiser (e inclusive parar de ler agora); a poder caminhar livre; cantar; sonhar;construir; realizar.Mas é tão mais fácil ser a vitima não é mesmo?...O mundo já é cheio de vitimas (reais) demais, para se compadecer de mais uma patética crise existencial...Ou por acaso acham que são os únicos a não realizarem seus sonhos?!
Ora, ninguém tem a vida que sonhou, e se tem, é a mais infeliz de todas as pessoas.Só não Sonha quem já está morto.Aliás, o Sonho, irmão da Morte, por ironia é seu antagonista.Uma antiga questão familiar, mas isso não vem ao caso.
Era nisso que pensava, enquanto através de um fresta, de um barracão em forma de corredor( anexo ao posto Esso da Jardim Botânico com Saturnino), observava os pedestres.Tinha um deformidade rara e um doença degenerativa, que já lhe causava dificuldades de locomoção.Os pais eram ciganos, e venderam-no para um senhora, que era proprietária de alguns apartamentos.Desde cedo prestava serviços de contabilidade ao posto de gasolina.De fato, poucos egoístas em meio à “pressa” muitas vezes forjada ( devido ao medo de encarar o meio, e cair num dos abismos da consciência) paravam para notar que o barracão era uma continuidade de um segundo andar do posto.Mas ela notou...
Talvez pelo fato de ser arquiteta, talvez pelo hábito de observar cuidadosamente o caos das construções urbanas.Por um breve instante,olhou fixamente para o barracão, e ele notou.Pela primeira vez tinha certeza de que alguém se importaria se o visse.Sentiu-se um pouco menos amaldiçoado, sorriu.Foi uma pequena alegria, mas suficiente para evitar o suicídio, que sentia estar próximo.Assim como esteve perto de seus pais, quando se despediram, dizendo que viajariam para bem longe da maldade humana...
E voltou a fazer os cálculos, olhando as aglomerações de pombos.


Lucas O. Mourão
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Caros leitores,
voltarei a escrever com frequencia em meados de janeiro...a continuação de zahr está sendo trabalhada, nao se preocupem, e bom Natal a todos!

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Apenas Status Quo

Sempre me disseram que a sensação pós-bebida alcoólica era incomparável. Comentários aqui, comentários de lá e o byronismo alcoólico (se é que isso não é uma redundância), mantinha-se sempre no seu processo de formação imaginária e obscura em minha mente. Já mareada do sempre “mais do mesmo”, lá fui eu atestar o que para todo mundo já era fato. Antes era apenas um pouco de cerveja e alguns goles de vinho. Poucas vezes no Natal umas tacinhas de sidra. Nada demais. E eu continuava a procurar o “fantástico” e o “fabuloso” que até então ainda não me fora revelado. Indo mais a frente, com um pouco de champanha e uma boa dose de vodca, lá estava eu mais que nunca, frustrada. E o tal efeito maravilhoso? Seria este apenas um pouco de vertigem e uma incapacidade de falar alto e claro? Sem contar no gosto da própria bebida, que na minha opinião o que a estraga é o álcool. Irônico demais, quando o que dá “os efeitos” é o próprio. Mas se é que posso comparar, “beber” seria o mesmo que parar em um posto de gasolina e entornar uma garrafa de gasolina goela abaixo. Acredito piamente que o cheiro, a sensação de ardência e o gosto seriam os mesmos.
E ainda ouço quem acha que entende do assunto me dizendo que a culpa foi a bebida escolhida. Pode até ser. Mas considerando que todas continuarão com o mesmo gosto acre e a ardência laríngea, não. E muito obrigada. Chega de frustrações em torno de sensações, pra isso deixo minha vida amorosa.
Coisas como essas nos fazem pensar o “Por que bebemos”. Seria para “entrar para o clube” e poder dizer “Eu bebi” ou apenas para comemorar com os amigos e pode cantar a música do skank “Desce mais!”. Se fizermos um pouco de esforço o segundo motivo é praticamente o primeiro, só que um pouco de pó-de-arroz, sombra e blush. Por que comemorar com os amigos tem envolver bebida alcoólica necessariamente? Pergunto isso porque se um pedisse vodca ou tequila e o outro embarcasse no suco de laranja ou no mate, certamente o reprimiriam. Eu continuo com idéia de que uma sprite desbanca qualquer um. Pena é que para achá-la só mesmo fazendo um esforço hercúleo. Enquanto os meus amigos estão no terceiro copo da redonda no shopping, por exemplo, eu ainda procuro uma mísera latinha verde (que não é soda).

sábado, 15 de dezembro de 2007

Zahr-parte 1

Zahr:


Introdução:

Olhava a pilha de formulário a serem preenchidos.De todos os lados, sons típicos de um escritório: telefones tocando, secretárias passando, o burburinho dos colegas que discutiam os planos para a noite, tomando café.Tudo tão tedioso.Será que só ele se sentia sufocado pelo cotidiano?Se levantou, foi até a janela.A visão de um mar cinzento à sua frente.Não pensava em nada, afinal não havia nada, ou melhor, tudo era inerte.Mesmo as coisas que se movimentavam eram tediosamente previsíveis.Ele, só mais uma criatura patética, em busca de alguma forma de reconhecimento.Nada mudaria.Queria ser aquela gaivota que voava à sua frente, sempre explorando novos territórios. “Cansado do trabalho?” Era a voz do chefe, vindo de trás: “Vamos fazer o seguinte, já são quase sete, pode ir pra casa, você já fez um bom progresso essa semana! Hahaha...” Sabia que era tudo mentira, papo furado, parte da política da empresa: dar impressão de bem estar, fortalecer a vaidade dos funcionários em nome da companhia...Não importava, queria sair dali o mais rápido possível.
Na volta, passou por um sebo, procurando algum vinil, ou livro de ficção.Já que a vida é tediosa, fantasiemos outras realidades, pensou.Adorava aquele lugar,não tinha aquele ar pretensioso das livrarias “multinacionais”, quase todos os livros eram de segunda mão, tinham história.Isso o fascinava!.As pessoas daquele meio pareciam admirar verdadeiramente os artigos.Estava farto daqueles pseudo-intelectuais, até mesmo dos intelectuais das “multinacionais”.Estava farto de qualquer esforço em nome de uma aparência, e aquele lugar era o mais verdadeiro possível.Terminou comprando o último livro do Sandman, O Fim dos Mundos.Deve ser interessante, pensou, ainda mais com uma apresentação escrita pelo Stephen King!Quem será o maluco que se desfez de uma obra dessas...
Em casa, nem chegou a jantar.Sentou-se na poltrona que fora de seu pai, pegou o livro, começou a ler.Em quatro horas havia lido tudo, e pensava que aqueles tinham sido os centavos mais bem gastos em muito tempo.Exausto, acabou dormindo.
O azul se fundia com o roxo, em nuvens de fumaça cor violeta.De todos os lados vinham luzes brancas, que oscilavam como uma lâmpada com mau contado.Havia uma sensação de velocidade indescritível, e a cada instante surgiam novas nuvens, de diversas cores, se revezando incessantemente .Não havia cheiro, mas ainda assim era a sensação mais intensa possível, para um ser humano. Inclinou a cabeça tentando olhar para baixo, foi só então que percebeu que não havia “baixo” nem “cima”, e que estava descalço.Que sonho mais bizarro, afinal por que nunca uso sapatos nos meus sonhos?...Freud deve explicar isso, pensou em tom sarcástico.
Acordou.Até que enfim, tava cansado daquela loucura...Os olhos,abriu-os lentamente, pois a luz os machucava.O solo era árido...Não estava em seu apartamento, mas sim em um local ermo, totalmente deserto.A paisagem era arenosa e havia tufos de capim esparsos, entre pequenas poças rasas.O Céu era de um tom vivo de azul, e ao longe montanhas e colinas, com neve nos cumes, o circundavam.Levantou-se, estava mais pesado que o normal, sentia dificuldade em se equilibrar.Ao longe surgia a silhueta de uma mulher envolta em um manto de pele de urso.Caminhava em sua direção serenamente, com o olhar fixo nele, portando um peixe- preso por uma rede, na mão esquerda.Também estava descalça, reparou.
-Quem é você?
-Descanse viajante, poupe esforços.Estávamos ansiosos por sua vinda.Mas tudo deve ser realizado a seu tempo, não é mesmo? Amanhã sua mente estará mais clara...
(continua)
Lucas O. Mourão

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Metapoema

Esse poema é um suspiro
Um desespero, a solidão dividida
É um corte fundo
Um desabafo, uma memória partida

Esse poema é o âmago,
O mundo despencando, concentração de agonia
É a mágoa acumulada
O não ter pra onde ir numa noite fria

Esse poema são lágrimas não choradas
É o miolo da couraça em formas simplificadas

Cesariano

"Até tu, Brutus, meu filho"


Honra despida
Orgulho assassino
Vergonha foragida
Ódio divino

Mérito? Que mérito?
Diga-me, cobra mascarada!
O justificável inquérito
Precedido da facada

Conseguiste o que querias?
E agora me olhas com desgosto?
Aproveitaste o que podias?
Obrigada pela pegada no rosto

Genial! Ou não... (6ª edição)

Olá, meus caros!
Ao contrário de todos, resolvi postar dois textos hoje. Perdoem-me pelo excesso de sentimentalismo da semana, prometo que volto à minha métrica assim que possível =).

Enfim, hoje tive uma experiência e tanto ouvindo músicos de verdade tocarem. E no meio do meu êxtase musical, Wave a piano e flauta, me perguntei como as pessoas que passavam podiam ignorar algo tão belo, que só tomaria uma parcela de suas preciosas rotinas. Como resistiam ao encanto do fauno? Como não estavam prontos para serem servos daqueles semi-deuses? Como negligenciavam a música divina?
A dúvida durou pouco, já que o improviso do piano chegara, trazendo toda sua jinga brasileira, num solo de pura inspiração, daqueles que se fecha os olhos e se sente os dedos correndo pelas teclas por vontade própria. Em compensação, voltou agora, mais intensa. Será que a ocupação de andar sem rumo pelo shopping prevalece a tal espetáculo? Será que a mente dessas pessoas não sente a magia daqueles sons?
A única conclusão que chego, e acredito que chegarei eternamente, é a falta de interesse, a falta de "tempo", que se resumem numa falta de Carpe Diem

Recomendações: O CD "Birds of Fire", da Mahavishnu Orchestra. Com sua melhor formação, uma das grandes representantes do Fusion inaugura seu estilo próprio, cuja única palavra que associo é gauche – não se encaixa em nada que ouviste antes.

Até quinta que vem!

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Além dos ventos

De um fundo azul e bordas marcadas
em duas órbitas cheias de sonhos
transbordando sóis em manhãs douradas
seus olhos emitem o brilho
de uma estrela sozinha

Através do universo,
sinto seus passos na areia
Sei que andas em direção a mim
Sei que pensas em mim
e que devora cada vã palavra

Ao olhar pela janela e sentir o abismo,
pode jogar-se pois sabe que estarei lá
Serei o fim do caminho,
um súbita conclusão,
o chão macio
além dos ventos da queda

Alice Caymmi

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

"De contemptu mundi"

Foto: Lucas O. Mourão( Dia chuvoso de novembro)


“De contemptu mundi”

Os tempos são outros, os sorrisos os mesmos
Nos rostos das crianças que caminham pelo bairro
-Eu envelheci,
-Todos nós...
Mas tantos outros nasceram, apesar dos que se foram
A pobreza é a mesma:
Os meninos de rua cresceram,
Mas as barrigas não pararam de parir
De modo que, após tanto tempo
Esses miseráveis na verdade ainda são os mesmos
Direita, esquerda,direita, esquerda
Os governos mudam,
A burocracia, sempre a especialidade da casa
Até as velhinhas que caminham nas praças aos domingos,
Parecem ser as mesmas!
Uma reforma aqui, outra ali, mais uns barracos na favela, mais uns terrenos ilegais nas mansões...
Mas a cidade ainda é a mesma
Depois de tanto tempo...tantas preocupações, alegrias e desgraças
É como se tudo acontecesse ainda pela primeira vez
Em cada vida uma história
Quase sempre aprisionada,muda até seu fim...
Como se a razão de existir fosse dar fim à desgraça da vida...
Talvez as coisas ainda sejam as mesmas na sua essência
Já que o homem ainda é espécie dominante
Num Mundo tão vasto, tantas histórias,
Tão pobres memórias...
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Lucas O. Mourão

Tempestade em Copo D'água

Benção, Afrodite de nós, mortais!
Pausa o mundo apenas com um piscar
Num segundo, a mente atingiu o jamais
Não quero, não posso, não devo contar

Ironia de todos os verões
Relinche, brabo, centauro orgulhoso
Corra, bem veloz pelas estações
E mantenha-se assim, bicho teimoso

De fascínio, tornaram-se rocha
O cintilar verde é hipnotizante
Sorris, e das estátuas debocha

Do triste sonho, vejo-me acordar
Santo pensamento cicatrizante!
Enfim, uma flor para desabrochar
__________________________________
O terceiro soneto, que batizei alternativamente de "Homenagem exacerbada", mas achei o título atual mais apropriado.

Prisão

O mundo parou nessa sala dura
O céu foi reconstruído em pedra escura
Crispo as mãos no ferro, em revolta
Suspiro da esperança sem escolta

A gota eterna não traz o sono
Sanidade dá o sinal do abandono
Escorre cruel nas temporâs frias
Universo confinado em vistas vazias

Anseiada liberdade, jamais!
Liberdade, somente o vento traz!
Vento? O que seria um vento?
Uma palavra apagada num momento

Grilhões cruéis, correntes malditas
Oh, a dor de punições infinitas!
No mundo de sombras, degradarei
Consciente da amargura que causei

Genial! Ou não... (5ª edição)

Olá, meus caros!
Minha humilde coluninha semanal diminui em P.G. nas férias por causa do meu eterno pecado capital – queria pedir desculpas por isso. Queria também apontar que o Hipóbole, durante nossas férias, funcionará como postagem semi-livre, só voltando ao seu funcionamento normal em Março de 2008, quando voltaremos todos às nossas rotinas (ou teremos rotinas novas, como é o caso da maioria). Postagem semi-livre significa que o colunista pode postar fora do dia ou não postar, mas nada de postar mais vezes na semana (como se isso fosse realmente acontecer =P).
Aliás, extremamente IMPORTANTE: ontem foi o aniversário da nossa literata de plantão – alguém lembrou de envergonhá-la bastante? Obviamente, minha reflexão semanal (inútil) será sobre isso.

Acho que a Ingrid nunca teve muito jeito – é um caso perdido desde que a conheci. Aliás, na verdade, a melhor definição pra ela é: um bicho estranho, que se alimenta de livros – e como come! – e pó de garaná com medicina. É uma garota orgulhosa, daquelas que teima, bufa, bate o pé quando acha que tem que; fala português corretíssimo, inclusive pronunciando bem o duplo r e vogais inúteis, como o U de louca; vicia todo mundo em Drummond; escreve divinamente – não que isso seja novidade.
Ingrid pode ser comparada a um porco-espinho de vez em quando – na verdade, quase sempre. Ela tem essa armadura permanente, um disfarce bem eficiente pros sentimentos, mas mostra a sua nobreza inabalável quando é preciso e o coração enorme. Acho que sempre contarei essa história quando for falar o quanto gosto dela, mas foi a garota que cruzou a chuva torrencial no sábado do meu aniversário, demorando 2 horas para chegar no local. Sou um tanto blaze perante a tudo, mas isso me comoveu de tal forma que grudou no meu coração. Do lado dessa garota.
Ingrid, espero tudo de melhor pra ti, com a maior sinceridade. Espero que saibas que me ponho de vassala diante de qualquer problema. Por fim, ao lembrar de ti, lembro-me sempre da frase da minha mãe quando te conheceu: "Essa menina vai longe – que garra!". Ela tem toda razão.

Recomendação da Semana
Pachebel Rant:
Nossa, esse vídeo fez minha semana. Achei GENIAL! Basicamente um comediante reclamando como é ruim tocar o Canon em D de Johann Pachelbel no Cello, mas simplesmente sensacional!

(Clarissa, querida, obrigada por me passar algo tão divertido – gostei tanto que resolvi repartir aqui no Hipóbole. Espero que não se incomodes. E por favor, sinta-se bem vinda para escrever qualquer parágrafo aqui pro blog (isso vale pra ti também, srta. Juliana))

Resolvi mudar a coluna (sim!) e mudar de frase da semana para música da semana. A bola da vez é, com toda certeza, "The Escapist", da minha eterna banda favorita Nightwish, que agora trocou a cantora e voltou com seu sexto álbum – o mais caro em toda história da Finlândia – Dark Passion Play. Eu, como qualquer fã chata, estou odiando e esperneando pela volta da Tarja. A esperança é a última que morre, não?
Aliás, falando em Finlândia e abastacendo-te de cultura inútil diária, hoje é dia de independência da Finlândia. Então, prepare seu CD do Sibelius e comemore com uma sauna!

Até próxima semana, espero!

domingo, 25 de novembro de 2007

Toda uma década no centro da cidade

O final do terceiro ano do ensino médio significa que está encerrado um ciclo de onze anos de nossas vidas. Levando em consideração que só temos dezessete e que uma teoria de Freud (lê-se fróide, Orei) diz que boa parte das memórias dos primeiros anos de vida logo se perde, esse ciclo está fortemente presente naquilo que chamamos lembranças. Alguns de nós nunca mais se verão, o que não significa que perderemos todas as amizades que cultivamos, mas que há uma tendência a manter contato apenas com os que eram mais próximos.
Mesmo que mantenhamos contato, teremos perdido a convivência a qual nos acostumamos. Foram várias as manhãs e tardes, de segunda a sábado que passamos no centro da cidade. E, quando digo no centro da cidade, não significa que visitamos os tão diversos sebos da região ou gastamos nosso tempo na Livraria da Travessa. Nem foi assistindo a um bom filme no Odeon ou jantando na Cinelândia que passamos os onze anos. Não foram tantas as vezes que fomos à Lapa ou assistimos a um show no Circo Voador que justificasse tanto tempo por aqui. CCBB, CCC, Casa França-Brasil, Palácio, tantos são os centros culturais e cinemas que poderíamos ter visitado; mas não, a área em que passamos nossas infância e adolescência fica ao lado da Marinha, perto da Candelária.
Esses onze anos no centro do Rio de Janeiro foram todos passados no topo do Morro de São Bento, ao lado de um mosteiro homônimo, num colégio de ensino fundamental e médio. A rotina foi, sim, maçante, mas nos acostumamos e sentiremos falta. O futebol no recreio, o almoço no bandejão, as animadas tardes de quarta-feira com dois tempos do Osni, enfim, são várias as coisas que não voltarão nunca. Mas tudo bem, logo esqueceremos de tudo isso, pois, como dizem alguns, pelo menos na Universidade tem mulher.

Seis semanas que passam

-25/11/2007-Uma semana para acabar o que foi, no sentido figurado, o ano de 2007. Tendo começado no dia 3 de fevereiro, mesmo que tenha durado apenas 10 meses, não tenho dúvidas de que foi meu mais longo ano. E o mais intenso. E o com mais mudanças. Soa dramático, talvez, mas valeu a pena. Me esforçarei para que o ano que vem, que começa para mim na outra segunda-feira, seja ainda mais intenso. E do jeito que as coisas andam nesses últimos trinta dias principalmente, tudo indica que será. Feliz ano novo, mesmo que antecipado, mesmo que simbólico, a todos vocês.
-O texto acima, devo admitir, não é original. Como já disse, o tempo tem sido curto. Não pensem, no entanto, que foi jogado aí para preencher espaço. Planejava já postá-lo nessa altura do ano. Por quê? Basicamente porque quarta-feira terei minha última aula no colégio em que passei onze anos, o São Bento. Sim, ONZE anos.
Originalmente foi escrito por mim, utilizando-me do ater-ego de João Sebastião Baldo, para a última edição do folhetim O Malho, que escrevemos, os alunos da turma 31, sobre o colégio. Mesmo que fosse uma revista crítica, qualquer um que lesse entenderia que somos uns dos que mais sentirão saudades do São Bento. Uma saudade hipócrita, é verdade. Mas ainda assim uma saudade.
Fica também como resposta para todos aqueles que me perguntaram, e sei que continuarão perguntando, a mesma coisa por tantos anos. Como é estudar no São Bento? Difícil de explicar; é tudo que tenho a dizer.

sábado, 24 de novembro de 2007

24 de Novembro de 2007

Não sei porque demorei tanto, – talvez pelo simbolismo do número 7, talvez uma hesitação puramente medrosa – mas resolvi escrever-te. Gostarias que soubesse que estou bem; que ainda tenho teu sorriso, teus olhos, teus trejeitos, tuas palavras e piadas, e teu nariz (e mamãe ainda me inveja por isso); que estou à beira de entrar na faculdade, mas continuo tua menina dos olhos, a caçula;
Desde aquele dia 25, o mundo mudou de forma drástica, nunca achei que iria agüentar a guinada – e de fato, não sei como agüentei. Incrível como me arrancou do meu mundinho e me mostrou que meus problemas eram insignificantes, minhas pirraças e discussões, supérfluas. Da minha inexperiência, pude ver que o universo é maior que eu esperava.
Espero ter sido a filha que sonhaste, com a vida que pediste a Deus, algo que valesse o sacrifício. Espero que esteja bem, com tudo que mereces e quiseres à disposição. Espero que agora se orgulhes de mim, pelos passos que dei, pela pessoa que me tornei. Espero que esteja cuidando de mim – de nós, na verdade – com teu pensamento, com sempre fazes.
Por fim, espero ainda ver teus olhos azuis e teu sorriso quando te perguntar se ainda sabes meu nome.

24 de Novembro de 2001

Uma rosa, nesse dia
Tão fraco, porém tão belo
Fruto da vil covardia,
Pelo que quebrou o elo

A rosa, desabrochada
Detalhe da mancha anil
Novembro vestido de Abril
Minha chaga escancarada

A rosa pelo meu mundo
Triste, trágico; e torto
Um pesadelo profundo
Que tirou todo conforto

A rosa murcha e partida
Deixo aqui, com minha vida

Genial! Ou não... (4ª edição)

Não sei se é surpresa para muitos eu estar postando aqui hoje, mas faço-o por um motivo nobre – uma coroa de louros merecida. Hoje, me restrinjo nesses meus pensamentos terrenos e volúveis, vou poupá-los disso; hoje é um dia demasiado especial.

Frase da semana: "Needed elsewhere, to remain us of the shortness of our kind"
(T. Holopainen, Nightwish; Angels Fall First)

Minha única recomendação da semana é um poeminha de Casimiro de Abreu, chamado "Segredos", que é um dos poemas mais bonitinhos que já li na minha nada longa vida.

Voltarei a postar na quinta na semana que vem, então até lá

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Possíveis explicações para a pós-vida

A pergunta é: O que será que acontece depois da morte? Todos a fazem, seja um pedreiro, seja um filósofo. Eu, particularmente, a faço antes de dormir, dedico uma boa parte daquele precioso tempo pensando no que vai me acontecer, mas esquecer de pensar em coisas que podem me acontecer em vida e que não vem ao caso agora...
Bom, depois de várias noites, três caminhos surgiram para mim. O primeiro me levou até o paraíso de alguma religião, qualquer religião, a idéia era de um lugar "perfeito", um vasto campo, com muitas árvores e pessoas de branco que caminhavam. Acho que fiquei com essa imagem formada na cabeça depois de ver uma novela da Globo, mas o que, na verdade, importa é que naquele lugar não existiam banheiros e as pessoas simplesmente andavam, por toda a eternidade, enquanto ouviam uma voz do alto, supostamente de Deus, que dizia coisas bonitas. Resumindo, um caminho direto para o tédio, sem vídeo-games, futebol ou comidas gordurosas, um mundo onde as angiospermas também reinavam.
Sem pensar muito, fui na direção do segundo caminho, quando me dei conto do que se tratava, tive uma grande a surpresa: Era o próprio vazio, o nada. Lá as pessoas simplesmente deixavam de existir, não lembrariam de tudo o que fizeram enquanto estavam na Terra, não lembrariam dos amores, nem das guerras, nem das aulas de química. Coloquei-me a pensar e vi que aquela situação não era nada justa, seriam anos jogados no lixo, e olha que eu até aceitaria esquecer os amores e muito mais as guerras, mas as aulas de química... Não perdi um ano inteiro para decorar que o anôdo é negativo na pilha e positivo na eletrólise à toa, não mesmo.
Foi aí então que corri para o terceiro caminho, esse parecia ser o mais o real e cruel ao mesmo tempo, nele descobri que a vida não passava de um grande Big Brother alienígena, fiquei envergonhado ao saber que todas as coisas que tinha feito só por achar que estava sozinho tinham sido observadas por alienígenas de todas as galáxias. Fiquei sabendo também que eu era só mais um robô e que logo, logo, seria encaminhado para aquele segundo caminho, o do vazio. Senti-me como Jim Carrey se sentiria se não recebesse um bom cachê por "O Show de Truman".
Agora percebo que estou vivo e que todos essas possíveis explicações para a pós-vida não passam de hipóteses, e mesmo que alguma delas seja a certa, todas me assustam. Não consigo imaginar o fim, nem a eternidade, nem o antes, nem o depois da vida. Dizem por aí que " A curiosidade matou o gato" e eu posso dizer que continuarei curioso para saber o que acontece com o pobre do gato.
Felipe Areias (do Blog Manifesto Metalúrgico)

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Depois de duas semanas...

Depois de bastante tempo sem ver e ler meus amigos do Hipóbole, cá eu estou eu. Por motivos que vcs já sabem...provas de pré-vestibulares, provas do colégio e do técnico e trabalhos. Coisas que nos fazem deixar de viver para vegetar. Mas como eu disse a Luiza, luto bravamente pra não ser inundada na tal "responsabilidade". Deixo a vcs um texto que já estava pra ser feito há um bom tempo...saiu de um "ir à padaria ao domingo com minha mãe". E claro, peço permissão ao Kendo para postar em seu dia...Mas acho q ele não vai se importar tanto. Enfim...sem mais delongas, deixo o meu texto.
E o vida longa ao hipóbole!

Uma conversa a um...

Ele está sempre lá. Todos os domingos, religiosamente com sua bolsa cinza, ás 2 da tarde ele chega e senta no banquinho da praça. Parece calmo, mas entretido, viaja num pensamento profundo, que quem passa nem imagina os seus motivos.
Solidão a dois...Solidão a um...Solidão a si...Ele fica diante de uma árvore e o vento leve parece embalá-lo. Nesse momento qualquer tipo de cumplicidade é válido. Qualquer “respirar” do mundo já faz um domingo de alguém que como ele, se isola pra poder ouvir a si mesmo.
Um domingo de um estranho. De alguém que não conheço, mas está como se alguém o convidasse a conversar na pracinha perto de minha casa. Nada demais lá, além de bancos, mesinhas para jogadores de damas ou xadrez, algumas pedras no chão, as quais não podemos deixar de pisar até chegar de fato á praça. A praça é sem nome. Mas pra que nome, quando cada ser que existe nela já lhe dá o próprio sentido?Formigas, pássaros, borboletas, as árvores, gatos e ele.
Crianças brincam de vez em quando lá. São poucas as vezes que vejo uma. Geralmente estão com sua mãe (e claro) não desgrudam do balanço. Outras, com mais senso de peraltice, se aventuram na areia e nas pedras. Fazem casinhas e usam as pedras como personagens. Já terceiras preferem lidar com aquilo que é mais próximo a si, não abrem mão da vida dos outros. Correm atrás de borboletas e deixam formigas desordenadas com apenas um palitinho de sorvete. Pobres formigas!
Ele observa. Vai absorvendo tudo. Quem sabe o que fará quando chegar em casa? Terá uma mulher que o afague e lhe diga que o lanche das cinco está pronto? Ou um cão que o umedeça de carinho? Ou sentará em frente à televisão desligada e ficará a pensar? Pode ser que talvez não tenha móveis, eletrodomésticos e que o domingo na praça seja o seu cinema, sua novela, seu teatro ou sua música de Jobim. Quem sabe?...

domingo, 18 de novembro de 2007

Cinco semanas que passam

Pois é, como a Luíza disse em seu post de quinta-feira, essa semana foi foda.
Em ambos os sentidos.

Passamos a semana no tal do Onu jr.

Nenhum texto essa semana?
Pois é.

Quase que dedicação completa ao evento; e ainda caiu no período do final do vestibular.

Semana que vem volto a publicar um texto de verdade.

Até!

Obs: Uma pena que o quinquagésimo post tenha sido assim.

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Moscou, 15 de dezembro de 1958

Desculpem-me, caros senhores leitores, mas por motivos de crise, não postarei nada além desse mísero texto que produzi no fim de semana. Nada mesmo.

Engraçado como as expectativas mudam um olhar. Fiz, hoje, domingo 11, assim como metade do Rio de Janeiro, mais uma prova de vestibular, longa e enfadonha. Acordei com sono pendente, parcialmente irritada com o mundo, fiz aquele famoso check-up, tomei um copo de leite e fui.
Para ser sincera, nunca objetivei a UFRJ, o pensamento sequer cruzara minha cabeça – nem em delírios profundos. Qual não foi minha surpresa em constatar a mudança radical do meu ponto de vista ao cruzar os gloriosos portões do campus da Praia Vermelha.
Prédios altos e majestosos marcavam a melhor da arquitetura neo-colonial, romanceados pelo jardim cuidadosamente mal cuidado, com aquela personalidade rebelde. O cenário remetia-me aos tempos da Rua de Matacavalos, o sobrado de Carolina – cave canem.
O mundo de sépia e da nostalgia, porém, passou ao Realismo mais que rapidamente quando entrei num dos prédios – a faculdade de educação, por mais irônico que isso soe. Por mais que o véu da antigüidade estivesse me seduzindo, não pude deixar de notar os maus tratos desmerecidos do local e sua adaptação grosseira ao século XX – lâmpadas fluorescentes esdrúxulas e meio quadro branco mal apagado, alem das decadentes carteiras de madeira podre.
A fascinação se fora; amaldiçoei o poder público pela heresia.

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Memórias Póstumas da Presa Fácil

Estava em um clube do centro. Ouvia os ruídos em volta, sentia o forte odor de bebida misturado com fedor de colônias baratas. Ria das piadas infames e me divertia na mesa de sinuca. As luzes indiretas e a fumaça dos cigarros davam um ar noir ao bar. Era uma noite como qualquer outra.
De longe, avistei uma mulher de longos olhares que assoprava a fumaça lentamente. Tinha cabelos negros de brilho azulado, pele de cor marfim colorida e olhos de colorido roxo. Tentadora. Encarava-me como um predador que olhava para sua presa. Tentadora. Como uma mosca que se aproxima da luz, dirigi-me até ela inconscientemente. Simplesmente me atraía. Quando me dei conta, já estava soltando qualquer cantada e risadas fáceis. Mas não conseguia escutar uma palavra que dissesse. Apenas me concentrava nos lábios que tão carinhosamente buscavam o cigarro e no som abafado da música. Ofereci um drink que, nem um pouco surpreendentemente, aceitou. Podia ver o brilho em seu olhar, o sorriso decorando seu rosto, a procura pela satisfação. Sabia que já era jogo ganho. Essa seria uma noite como qualquer outra.
Convidei-a para dançar e não tardou para estarmos aos beijos. Quando beijava, beijava com força e com raiva. Como se fosse me comer. Podia sentia o calor de nossos corpos abraçados. Beijava-me como se fosse me engolir. Sua boca tinha gosto de tabaco, mas suas mãos eram finas e delicadas. Os dedos longos traçavam seu caminho na superfície do meu rosto e no emaranhado de meus cabelos. Sabia que era jogo ganho e levei-a para o motel.
No caminho, resolvi tomar o controle. Cada centímetro de pele exposta me dava uma sensação de fervor. Não podia parar de notar no seu decote, que tão facilmente chegava ao alcance de meus olhos. Enquanto dirigia, entoava palavras e histórias que a divertia. Nunca tive dificuldades com mulheres. Dê-lhes o luxo da beleza, faça-as achar que possuem a vantagem do controle, inebrie-as com a desinibição do álcool e domine-as com o prazer do sexo. Incomodava-me, somente, as infindáveis tragadas. Não pelo cigarro em si – não, não possuía nenhum efeito em mim-, mas pelo molde que dava aos seus lábios. Disse que não me importaria mais tarde enquanto subia sua mão vagarosamente pela minha coxa. O efeito foi imediato: podia sentir o fervor nas partes mais íntimas e o desejo na flor da pele.
Quando chegamos, impressionou-me a ferocidade com a qual me despia. Seu corpo não passava de um vulto na escuridão. Tocava-a, mas não a sentia. Sua superfície estava molhada de suor frio. Seus gestos eram ensaiados e frios. Mas seu corpo expelia um calor tão intenso. Depois, os beijos viraram mordidas e os toques, arranhões. Se antes se movimentava brutalmente, como um animal que se soltara de sua jaula, depois passava a mover-se lentamente na velocidade de suas tragadas. Se em determinado momento parecia calculista e caprichosa, no outro, soltava faíscas pelos olhos raivosos. Virara uma dança, onde mudávamos de posição como quem muda de ritmo. Ela conduzia e eu fazia meu melhor para acompanhá-la. Transformou-me em um virgem, usou-me como bem lhe entendeu para somente gozar do meu prazer. Arrancou em cada suspiro e em cada gemido todas as minhas energias. Extasiado, fui dormir.
Acordei com um clique. De pé, já vestida com seu longo sobretudo e luvas pretas, dava as costas para mim. Podia sentir sua respiração pesada. Levantou a cabeça enquanto preparava a arma. Puxou seus cabelos para trás e olhou-me pelo canto do olho. Seu sorriso era inexplicável. Sua expressão era orgástica e seu olhar passou a ser gélido. Era uma besta feroz. Uma besta de calibre e silenciador. O cano negro de sua arma arrancou toda a cor do meu rosto. Já não conseguia mais pensar. Fui tomado por um desespero e por uma sensação de impotência desumana. Era a carniça e só agora tinha tomado consciência disso. Fui vítima de uma deusa com fetiches macabros. Femme Fatale. Implorava pela minha vida enquanto me acuava como um cachorro assustado.
De repente, o estouro abafado. Não houve túnel. Não houve luz. Nem céu nem inferno. Havia somente nós três: eu, o monstro e a minha insignificância.

Clarissa Maria, do blog Testículos Literários

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Metafísico

Ainda hei de entender
Esse negócio de Karma
Fundação milenar
Que Kant facilmente desarma
Como algo tão subjetivo
Como os conceitos do bem e do mal
Pode trazer resultado tão objetivo
Doença, falência, acidente fatal
Para quem não conhece
Irei explicar, acompanhe:
Se você faz algo bom
Algo que a sociedade considere de bom tom
Receberá os frutos, aos montes
Se fizer algo ruim
Roubar, matar, julgar, enfim
Pagará na carne, tudo o que fizera antes
Provavelmente essa idéia foi criada
Por um jovem hindu, de cabeça meditada
Achou tão genial, a iluminação que havia tido
Que na idéia não viu o real sentido
O que o jovem hindu não sabia, e agora vou explicar
É como Immanuel Kant, jogou seu conceito pro ar
Que pobre do garoto que não enxergou o fato
De que toda moeda, tem seu outro lado
O homem divide igualmente, seu último alimento com a família
Condenar tal ação, seria tamanha heresia
Talvez um e somente um homem possa condená-la
O padeiro, que reclamando do pão roubado
Pela situação comovente não se abala
Você pode tentar defender, o pai ladrão de pão
’’Ele roubou por necessidade o que vale é a intenção’’
Bela frase, mas rebato sem receio:
’’De boa intenção o inferno tá cheio’’
Idéia cruel, mas veja por outro lado
Afinal as más ações também tem seu valor
Um homem avança o sinal, e mata o outro achatado
A ação parece errada, se não fosse por um fator
O atropelado poderia ser um agiota
Que da família daquele ladrão
Havia extorquido, roubado, fizera a todos de idiota
Algo que respeito, creio com total razão
É a idéia de Kant, e sua ética universal
Desbancou com categoria, Aristóteles e Platão
Julgando a vida muito além do bem e do mal.

domingo, 11 de novembro de 2007

Descoberta

Foi quando fechei o livro
E olhei pela janela
Que entendi a poesia.

Se o Vaticano tem um, o Hipóbole também pode

Caso você preste atenção aos blogs que freqüenta, é provável que tenha notado a aparição de um desenho no canto superior esquerdo de nossa página. Um escudo para ser mais exato; nosso escudo. Mas para que um blog precisaria de um brasão se ele não é um Estado soberano que emite documentos oficiais, você deve estar se perguntando. Bom, pra nada exatamente, mas isso não importa. O que importa é que nós temos um escudo com um lema, dois mascotes, um capacete e tudo a que temos direito.
Como éramos dois os idealizadores e a Luíza é quem desenha melhor, ficou comigo a tarefa de explicar o símbolo. Parafraseando a primeira postagem do blog: ela desenhou, eu explico. Parece justo...
O processo criativo foi bastante simples. Primeiro, resolvemos que precisávamos de um símbolo. Em seguida, deparamo-nos com o brasão búlgaro (longa história!). Ao perceber que era aquilo que queríamos para o Hipóbole, entramos no Wikipédia e procuramos por “Coat of Arms”. Na página sobre o assunto havia um desenho, no estilo você também pode ter um escudo, a partir do qual discutimos, uma a uma, cada característica do desenho.
O desenho propriamente dito leva as cores que já caracterizavam o Hipóbole Conjugada, o azul escuro e o claro. Dentro dele, é possível encontrar um trocadilho matemático que não merece ser explicado por duas razões básicas: a)ele é sem graça e b)ele é matemático.
Precisávamos também escolher os dois animais que suportariam o emblema, então aproveitamo-nos para apresentar nossos dois mascotes: Hipo e Bole; Hipo, o ornitorrinco, e Bole, o Hipopótamo. O primeiro, também conhecido como grande piada de deus, representa nossa veia surrealista, enquanto o segundo, um cara gordinho e simpático, não é símbolo de nada, mas foi escolhido por a)ser gordinho e b)ser simpático.
O passo seguinte era escolher um lema. Para soar bem esnobe, resolvemos que ele estaria em Latim. Houve um problema nesse ponto; não sabemos latim. Uma vez mais, a solução estava no Wikipédia. Digitamos “citações em latim” e escolhemos a que melhor nos representava. Nil est dictus facilus- nada mais fácil do que falar. Perfeito! Essa era mesmo a idéia do blog, ao menos na concepção de nós dois.
Ficava faltando a parte de cima do desenho. Teríamos que escolher a galhada e um capacete. Quanto ao primeiro, não havia como inovar muito, então desenhamos uma galhada. Em relação ao segundo, escolhemos o do exército prussiano, que representa a obediência quase militar do núcleo parnasiano às regras.Estava, enfim, pronto o símbolo. Ou quase, pois faltava passá-lo para o computador e trabalhá-lo no Photoshop. Em relação à arte-final, não tenho muito a dizer, uma vez que foi a Luíza quem passou horas no computador enquanto eu escrevia um texto de quinze minutos. Como já disse, parece justo.

Quatro semanas que passam

_Ontem foi aniversário do Vitor (sim, vou chamá-lo assim) e, como sou o dos que aqui escrevem que há mais tempo o conhece, resolvi escrever um pouco sobre ele que, mesmo que a franja e as espinhas disfarcem, atingiu a maioridade (antes de mim!). Conhecemo-nos na oitava série, mesmo tendo estudado no mesmo colégio desde a primeira (hum, não foi ano do qual podemos nos orgulhar, mas tudo bem). No primeiro e segundo anos fomos virando amigos, mas foi no terceiro que a amizade tornou-se verdadeira. Poderia destacar um monte de qualidades e tal, mas você sabe que isso seria forçado, que não seria eu. Então direi apenas as três coisas que mais se destacam em você: as qualidades (como a de lamber o cotovelo), suas teorias (o imediatismo - “estudar pra quê? A prova é só semana que vem”) e, principalmente, seus conselhos (“Cara, e daí se ela é gente boa? Ela é boa, não importa a parte do gente”). Bom, fora essas brincadeiras (e espero que sejam mesmo brincadeiras), eu gostaria de deixar claro o quanto eu me alegro de ter criado um circulo de amizade fora do colégio que inclui você. Sei, assim, que ainda terei que aturá-lo por algum tempo (quem sabe até concretizando aquele mito de amizade beneditina). Resumindo o que disse (mania tua, por sinal) tu é foda!
_Sem provas nessa semana; e faltam apenas duas... \o/­
_De qualquer maneira, vai ter ONU Jr (por que tudo em Novembro?). Boa sorte para mim e para Luíza, representantes da digníssima e importantíssima República Popular da Bulgária. Já entrando no clima do Pacto deVarsóvia em 1958: até semana que vem, camaradas.

sábado, 10 de novembro de 2007

Andorinhas

Nunca havia notado...Como após a chuva, às cinco e meia, as andorinhas voam de árvore em árvore.São tantas que parece inacreditável não se colidirem e se deslocarem tão silenciosamente.São livres, pois voam para onde bem entenderem com perfeita maestria.Talvez eu só tenha as visto agora, após tantos anos, devido às circunstâncias.Talvez eu seja um homem desesperado, que busca na natureza alguma forma de sabedoria capaz de me orientar através das dificuldades.E que de alguma forma se sente maravilhado, privilegiado de fazer parte disso tudo.O fato é que vou passar por provações que desconhecia até hoje.Nunca o futuro foi tão incerto, e o medo tão próximo.Mas peço a Deus, que me de o dom de ser como a andorinha, para que possa voar para onde quiser, com essa assombrosa serenidade...como quem nada teme.

Vou me afastar do Hipóbole, por tempo indeterminado, espero a compreensão dos colegas colunistas e dos leitores...
Adeus.

Feliz Aniversário!

Parabéns ao colunista Vitor Okendo que fez anos ontem!E boa prova a todos os vestibulandos!

A Vitor Okendo

Segue-se aqui minha homenagem a um grande, recém-formado, homem.
Não te conheço desde que nasci, também não a tão pouco tempo. Dizem que a primeira imagem é a que fica, mas não me lembro a primeira impressão que tive de ti, lembro-me do dia, aquele sábado, comemoração do aniversário do Marco. Não sei o que pensei sobre ti, lembro-me de ter te achado engraçado. Mas assim, superficialmente bem-humorado, assim como todos ali. Quem diria que irias vir a ser uma das pessoas que mais confio.
Tenho muitas lembranças contigo já, nesses meros 6 meses. Um tanto inacreditável, quase surreal, mas verdade. Se tornaste parte importante do meu 3º ano, da minha vida mesmo.
Acho que nunca te vi de mau-humor, tens uma tolerância maravilhosa, quase um escudo para aborrecimento, além de piadas estúpidas, afiadas e bem colocadas, nas melhores horas (Hum... Deus, Deus =P); és mais que confiável, nunca me decepcionaste: sempre estivera lá quando precisei. Muitíssimo obrigada, aliás; Por fim, és uma das pessoas que mais admiro.
Acho que mesmo com características mentais curiosas (1101011!!!111), és uma pessoa maravilhosa, digna do melhor e somente dele. Aproveite bem essa data, ela é única.
Mais que sinceramente, da sua colega de blog e amiga,
Luiza N. Silva

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Camila

A escuridão predominava e o céu estava sem estrelas. Estava num desses subúrbios, andando pelos becos como de usual. Era uma daquelas noites inexplicavelmente frias do verão, que nos fazer encolher dentro do sobretudo. O vento gélido soprou novamente, me deixando ansiosa. Necessidade, arg! Puxei o maço do bolso e o isqueiro laranja que comprei ao completar um ano de vício – minha miséria merece ser recompensada de alguma forma. Hum... nicotina! Minha salvação em forma de abismo.
A lua já passara de seu ponto mais alto, devia ser algo perto de uma da manhã mas, sinceramente, não importava mais. Entretanto, num súbito impulso, decidi voltar – andara por horas e não estava perto de encontrar solução para minhas frustrações. O caminho de volta foi absolutamente sem-graça, como a ida, como tudo no atual momento.
Abri a porta de casa, onde contas me esperavam – não que fosse um problema, nunca era. Era apenas desanimador, mais uma gota de um maremoto. Tirei o sobretudo, sentei-me ao piano, a única alegria da vida e fechei os olhos, tocando as divinas teclas de marfim. Sonata ao Luar, terceiro movimento. Os pensamentos fluíam livremente enquanto meus dedos percorriam seu caminho natural. Cenas da noite anterior começaram a rodar minha cabeça em flashes cinematográficos – a noite tempestuosa, os becos a Noroeste, a taverna... Forcei os olhos tentando expurgá-las, o que não funcionou. Então abri-os subitamente, suando frio – odiava a sensação. Terminei a peça de olhos abertos e acendi outro dos meus Camel. Não fumava outros, porque era como tocar um piano que não era o meu: perda de tempo. Há alguns objetos na vida que simplesmente encaixam, é como se apaixonar – uma vez encontrado o certo, não há o porque de um outro. E aquele cigarro era assim: moldava com meus lábios, descia suave minha traquéia e destruía meus alvéolos com carinho, quase. Tentador.
Levantei-me e olhei no espelho. A figura que me fitava era abatida, com olheiras profundas, cabelos negros de brilho azulado e pele branca desgastada – em que espelho ficou perdida a minha face? Bah, não, odeio Cecília! Gosto de Fagundes, Casimiro, Álvares e sim, sofro do baço.
As tonteiras de sempre tomaram conta de mim. Apoiei no piano e coloquei a mão sobre a têmpora – dois minutos e estava tudo bem. Automaticamente caminhei até a cozinha, já que desde ontem não havia comido nada. Não sabia o porquê, talvez fosse uma espécie de auto flagelação. Entrei e a faca que jazia sobre a mesa ameaçou-me – por um momento, senti-a cravada em minha garganta. Se eu conseguisse me ver, tinha certeza que repararia em meios olhos então arregalados, minha palidez e os suaves movimentos que minha mão fazia sobre minha traquéia, num misto de alivio e decepção.
Estava angustiada novamente. Sabia que meu corpo pedia uma tragada e meus dedos, o piano de volta. Atendi ambos, começando o Ostinato de Bartok. De vez em quando, tirava uma das mãos e segurava o cigarro. Acho que a escola erudita nunca me perdoaria. Ao final, deixei o improviso correr e, ao desviar minha atenção de meus próprios pensamentos, escutei o Steinway uivando angustiado. O solo ficava mais rápido – não por minha própria vontade, mas por ser um reflexo do meu inconsciente. E à medida que este foi tomando forma vi, apavorada, minha própria necessidade pulsando.
Olhei o relógio da parede: só tinha se passado meia hora. Senti-me tentada, fitando o sobretudo convidativo – estava ali, lindo, minha maça a morder. Vi-me saindo pela porta, numa súbita vitória da serpente, apalpando os bolsos para checar meus pertences. A segurança tomou conta e estampei um leve sorriso. Mesmo assim, a batalha interior continuava, mas agora era tarde: já passara do ponto sem retorno.
Saí na escuridão tão familiar e, ao mesmo tempo, tão intrigante e tenebrosa. A ansiedade trilhava minhas veias e o sorriso não desaparecera. Alguns momentos conscientes imploravam uma meia volta – sabiam que amanhã estaria infestada com culpa. Entretanto, nada disso importava mais – estava cega.
Entrei num clube do centro e escolhi a vitima, um rapaz alto e charmoso, presa fácil. Não que isso importasse, só tinha que saciar a vontade. Sentei-me no bar e acendi mais um cigarro, jogando-o olhares longos enquanto soltava a fumaça vagarosamente. Não demorou muito para entender: veio em minha direção com uma cantada barata, ofereceu um drink e flertamos por algum tempo. A conversa fraca e desinteressante me causara ânsia de vômito, mas o rapaz era bonito, então mantive o sorriso plastificado. Enfim, convidou-me para dançar e não ofereci nenhuma resistência. Seu jeito alimentava a raiva que havia se estabelecido – mesmo assim, não demorou muito para estarmos aos beijos. Senti-me melhor, chegava perto do meu objetivo. As circunstâncias levaram-nos ao carro e depois, a um motel.
Durante a viagem, não me dei ao trabalho de ouvir o que falava, só sabia que gostava de falar de si mesmo. Francamente, não a melhor estratégia. Franziu levemente a testa quando acendi um novo cigarro, que acompanhou com uma piada sem graça qualquer. Dissimulei e acariciei-lhe a coxa, dizendo que não iria se importar mais tarde. Não me surpreendi com a reação involuntária.
Chegamos no quarto e a situação esquentou: usei e abusei do garoto. O relógio bateu quatro e ele já dormia. Sentia-me melhor; olhei para seu corpo e sorri. Vesti-me apressadamente, colocando luvas de couro por causa do frio. Por fim, devolvi o pesado sobretudo a meus ombros. Enfiei a mão no bolso e uma carga de adrenalina percorreu-me. Meus dedos moldaram-se na corona e tirei a pistola do meu pai – uma bela Smith & Wesson negra com um silenciador adaptado. Respirei o poder venenoso e finalmente carreguei a arma. O clique acordou o jovem, aumentando minha satisfação. Vi que sentia vontade de gritar por socorro, não o fez porque alarmei-o das conseqüências. O controle me viciava, sabia que a vida daquele menino estava em minhas mãos – poderia poupá-lo, mas não ia. A palidez evidenciava seu pânico. Claramente via a vida pela frente destroçada pela luxúria. E se arrependia.
Mudou de tática em alguns minutos, implorando pela vida. Seu desespero só me divertia, até que perdi a paciência, dando-lhe dois tiros no peito. Segundo depois, parou de respirar.
Ajoelhei-me sobre o corpo, fechei seus olhos e toquei o sangue. O efêmero prazer tomou conta – sentia-me saciada. Mas a realidade bateu cedo demais: a gota de sangue escorreu e pingou. Olhei no espelho e vi um monstro.

Genial! Ou não... (3.5ª edição)

Minha coluna hoje está pobre, não tem fluxos de consciência nem recomendações. O principal motivo disso é o tamanho do conto que postarei hoje, o que inclusive me impediu de postar meu último poema. Não que isso realmente importe, ele aparecerá semana que vem mesmo.
E para as pessoas que acharam que 3.5 é uma referência ao D&D, sim, vocês estão cobertos de razão
Boa Prova a todos os vestibulandos da Federal e até próxima semana!
Frase da semana: "Ignorance is blissful" (W. Shakespeare)

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Discurso de Formatura.

Bom dia, pais, mestres, parentes, alunos, colegas, amigos. É uma honra estar aqui à frente de vocês discursando sobre aquilo a que dediquei grande parte de minha última década, o Colégio, e é com grande prazer que aqui o faço.
Hoje pela manhã, fui acordado bruscamente pela desagradável voz do meu despertador falante, e pensei: ‘’Puta que pariu, tenho que fazer o discurso. ’’. Talvez tenha sido o imenso nervosismo, ou o fato de não me achar bom o suficiente para estar aqui em cima, a razão de minha amnésia. Não importa. O fato é que já estava à uma hora do presente, e não havia nem pensado como começar o falatório.
Puxei a camisa social que estava estendida na cadeira, enfiei pelo pescoço a gravata com o nó previamente feito, pois honestamente, nunca me dei o trabalho de aprender esse tipo de coisa que farei pelo resto da vida. Até escovei os dentes, visto a ocasião especial.
Já estava saindo de casa quando me lembrei das calças. Nesse ponto decidi que se tratava de nervosismo. Agora só intensificado pela protela do discurso. Saí correndo para pegar o ônibus, já que minha família inteira decidiu viajar para Cancun e me deixar aqui sozinho. ‘’Você não pode ir com a gente! Tem que fazer seu discurso lembra?’’. Pelo jeito não.
No caminho para o ponto decidi o óbvio: Faria o discurso ‘’nas coxa’’ enquanto vinha para o colégio de ônibus.
Resolvi esperar o ônibus com ar, não queria chegar a minha última convivência colegial suado e ofegante, apesar de ter passado a maioria dessas convivências nesses estados. O ônibus chegou mais cedo do que esperava. Finalmente uma quebra na lei de Murphy que regia meu dia! Encarei isso como um sinal divino.
O discurso estava pronto para ser feito, quando pensei na dura realidade: Como fazer algo que deveria ter dedicado dias, em uma jornada de apenas trinta minutos? Eu li uma vez que a criatividade fluí melhor durante o pânico da véspera. Decidi crer no potencial humano. Resolvi começar. Senhoras e senhores, por onde?
Se tem algo que eu aprendi a fazer bem nesse colégio, foram provas. ‘’Na dúvida de uma questão, faça sempre por eliminação. ’’ Resolvi eliminar o que não devia falar aqui hoje, para assim começar a escrever.
Primeiro, um discurso deve ser algo universal, era melhor eu não falar sobre minha vida. Infelizmente agora percebo que é tarde demais. Segundo, não deveria demonstrar nervosismo. Falhei novamente. Achei que não seria de bom tom falar mal de matérias ou de professores, por mais que grande parte de minha alegria da formatura seja pelo fato de nunca mais ter que olhar para um Benzeno novamente, nem ter de ouvir o falatório monótono do mestre de Química. Droga, esse método não está funcionando.
Respira meu filho. Potencial humano se lembra? Retomando. Não deveria falar sobre a saudade hipócrita. Isso eu consegui. Acho que seria até legal jogar uma piada sobre isso. Ahem. ‘’Aposto que a saudade que sentiremos uns dos outros não é maior que a saudade das noites perdidas da véspera da prova de Física não?’’ HÁ!
Tudo se encaixava, a piada ajudou a aliviar minhas tensões. Tudo estava claro. O discurso estava escrito de leve no papel, só deveria reforçá-lo com minha letra.

Infelizmente senhoras e senhores, o ônibus havia acabado de chegar.

Muito Obrigado.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Ausência

Por muito tempo achei que fosse o não estar
O estar sozinho
O vagar sombrio
Aí percebi que era um bicho que fica dentro do peito da gente
Comendo-nos aos pouquinhos

Achei que fosse o não aparecer
Mas vi que mesmo contigo
Continuava aqui dentro um vazio
Aí constatei que era o estar junto também

Pensei que fosse o teu silêncio
Entretanto quando falavas, não era comigo...
Cogitei até mesmo um duplo sentido
Mas não se encaixou
Porque a ausência foi apenas algo que eu inventei pra te ter como abrigo.

A Vida...

"A vida não vale a pena e a dor de ser vivida"

A vida é triste
Não vale a pena
é tão pequena, tão inútil
por que vivê-la?

A vida é cruel
Nos jogam neste mundo
como se fôssemos meras "coisas"
e não nos ensinam a viver;

A vida é pétrea (já dizia Drummond),
Crava seus dedos de ferro em nós
vai rasgando...nos deixa desidratados
Meros marionetes acabados;

A vida dói
é ferida aberta
é puro amor que não se preza
é cuspe na cara;

A vida é pobre
Cheia de meninos na rua
Cheia de barrigas vazias
e pessoas desempregadas;

A vida é injusta
o pão que é servido na mesa de uns
é o mesmo que falta,
na mesa de outros;

A vida não vive aqui
foi-se embora
deixou abraços e beijos
riu de nós e não perdeu sua hora.

domingo, 4 de novembro de 2007

Telos

No princípio dos tempos, o mundo era claro e vivo. O mar, as flores, o sol, tudo no mundo o coloria alegremente. O dia e a noite revezavam-se assistindo as mais diversas espécies que viviam em harmonia. O alimento e a água existente saciavam a todos; nada atrapalhava os ciclos da natureza.
No primeiro dia, uma espécie se espalhou pela terra. O Homem se multiplicava e, por algum tempo, manteve-se respeitando os outros seres. O Homem era feliz de maneira inofensiva à terra.
Então, no segundo dia, um humano ofendeu outro. E a família do segundo se sentiu desonrada. E a família do primeiro o defendeu. A tribo se dividiu em duas, tendo início a primeira guerra. Os vencedores se sentiram superiores, e fez-se a escravidão. Os líderes da tribo gostaram da experiência e resolveram ofender outra tribo. O Homem passou a lutar por sua terra, e por sua mulher, e por sua honra, e por tudo aquilo pelo que, segundo ele, valia a pena morrer, mas principalmente matar. E até por deus, que teria criado tudo, o Homem lutou.
No terceiro dia, conforme desenvolvia seus métodos de produção, o Homem desejava novos, cada vez mais eficientes. E o Homem criou a máquina. E o Homem disse: haja o Progresso. E as máquinas trouxeram o Progresso. E o homem regozijou-se pelo que havia feito.
O Homem viu que o Progresso era bom e, no quarto dia, continuou sua busca pelo Progresso. E o homem disse: que se faça as trevas. Com as cinzas do carvão e com a fumaça das fábricas fez-se as trevas. E o Homem orgulhou-se por ser o mais inteligente ser sobre a face da terra.
No quinto dia, o Homem pensou: não é bom que o Progresso esteja só. E começou a explorar o petróleo. E o petróleo ajudou o Homem na busca pelo Progresso. E as plataformas espalharam-se. O petróleo estava agora, em todos os cantos da terra, junto ao Progresso.
Vendo o quanto era superior, no sexto dia o Homem resolveu aproveitar-se cada vez mais do que lhe fora dado. E os céus e os mares foram poluídos. E tudo começou a extinguir-se. Conforme avançava o Progresso, a terra ficava mais feia, e vazia, e cinza.No último dia, a obra do Homem estava pronta.
E o Homem descansou sob a terra orgulhoso de tê-la modificado, eternamente.

Rua Dom Gerardo, 68

Ao subir uma última vez os degraus de meu Ateneu
[reflito:
Como percorro em poucos minutos
Os dezesseis lances de escada
A que devotei onze anos?

-Vão-se as horas de espera
Na fila do primeiro andar.
E os empalhados do segundo,
Os preços a que me acostumei,
As aulas de flauta... TA-Á.
-Vão-se aqueles almoços
Realizados em horário notório
No bandejão que virou couve-flor
(Enjoei-me de tanto feijão)
As horas no refeitório...
-Vão-se o rala-coco e o campão
Todas aquelas partidas
Jogadas desde que chegamos
Ao pátio do quinto andar.
Os anos de ginásio, de calças cumpridas.
-Vão-se as aulas que matávamos
No sexto andar, na enfermaria
E a oitava série negra
Que vivi no sétimo andar
(Preto, guitarra, anarquia).
-E agora o oitavo andar
De onde eu vejo a Baía.
Findo o ensino médio,
Vou-me eu embora
Na esperança de voltar algum dia.

Vão-se as imagens, os prazeres,
Vai-se cada peculiaridade

Ficam os Valores aprendidos
Ficam as Amizades
Fica a Saudade Hipócrita.

Três semanas que passam

_Políticos são todos iguais?
Para algumas pessoas, as eleições são um momento de mudança, de esperança, de separar aquilo que é bom do que é podre na política. Se você é uma dessas pessoas, ainda bem que você não mora na Polônia (a menos que você more na Polônia, saiba ler português e freqüente esse blog, o que é pouco provável).
Duas semanas atrás, no dia 21 de outubro, os poloneses escolheram seus representantes para o legislativo. O antigo primeiro-ministro, Jaroslaw Kaczynski, do partido de direita PiS, viu sua legenda ser derrotada pela Plataforma Cívica, do político de centro-direita Donald Tusk, apoiada pelo ex-líder do Movimento Solidariedade, Lech Walesa.
Até aí tudo bem, as mudanças parecem ter ocorrido e tudo mais. No entanto, dizem que um registro fotográfico vale mais que os escritos e o processo eleitoral foi marcado pela seguinte foto, em que o ex-primeiro ministro cumprimenta o atual presidente, seu irmão gêmeo. Tirem suas próprias conclusões.
_Em resposta ao trecho que me toca (metaforicamente) no texto do Kendo da última terça-feira, gostaria de completá-lo com uma passagem relativa a nossa vida na oitava-série. Ocorreu no dia 10 de Novembro de 2004, seu aniversário; Seu pai nos levaria para o Hot Zone. Mas, pensei, o Vitor não disse diversas vezes que seu pai não era outro senão o próprio diabo? Qual não foi minha surpresa ao descobrir que o motorista do carro não era o capeta, o tinhoso, o das sete peles, ou outra nomenclatura que ele tenha usado, mas um senhor com uma profissão honesta, a da urologia...
_Àqueles que estão sem fazer nada na internet esse domingo, sugiro o curta O Paradoxo da Espera do Ônibus, um dos melhores da última Maratona Odeon. Um texto que também recomendo é a crônica Ter ou não ter namorada, de Artur da Távola, que pode ser encontrado em qualquer blog (que dirá que é de Carlos Drummond) se você procurar no google.
_Até semana que vem, boa sorte aos que farão prova da UFRJ no domingo.

sábado, 3 de novembro de 2007

Trova Épica de Verão


Trova Épica de Verão



Estava tudo acertado.Tudo planejado.Fizera o último telefonema, escrevera seu testamento, já havia fechado a conta no Banco (a parte mais demorada, que fez o compromisso ser adiado em quase cinco meses), declara seus pensamentos mais ocultos às pessoas mais inconvenientes, faltara o trabalho para passear sem rumo.Mas mesmo assim era tão difícil...Olhava a dose de cianureto.Olhava para o chão.Como pude...Deixar as coisas chegarem a esse ponto...A derrota lhe era certa: não importava o seu esforço.Mesmo que a realidade não fosse penosa, não escapava da monotonia.Pronto!Decidido!Olhar só mais uma vez pra esse céu.
Mas que surpresa!As árvores do vale...Era simplesmente maravilhoso.As folhas estavam douradas, com uma beleza nunca antes vista.Nesse instante, seus olhos, há muito vendados, pela grossa camada de desesperanças cotidianas, voltaram a enxergar.Olhou ao seu redor...Recordou-se de momentos da infância.Olhou ao redor novamente...E tudo fez sentido.Subitamente se lembrou de suas idéias, suas buscas, e do ardor, da paixão pelo que fazia.Percebeu que há muito seu trabalho era esvaziado de emoção.Não se esforçava por achar os elogios suficientes...Nunca foram, nunca seriam.De que lhe adiantara estudar com afinco, se não sabia onde queria chegar?!Num só movimento jogou fora aquela droga de veneno, e já se sentia mais calmo.Plena placidez de alma.E logo veio à sua mente a seqüência de notas de uma melodia.Era uma trova!Tão única e inexplicável quanto cada uma de todas aquelas folhas, de todo aquele verde transformado em dourado! Correu para o quarto, montou a máquina.Era necessário captar aquele instante que salvara sua vida.Preparou tudo, dessa vez com menos teoria, e mais amor, e tirou a foto.












(Ipês florescendo, 02/11/07)
foto:Lucas Mourão


Era o inicio de um novo tempo.Veio à sua mente uma frase que Neil Gaiman dissera em uma entrevista: “Não se trata de acreditar que dragões existem, se trata de acreditar que se eles existissem haveria homens capazes de derrota-los”.Pegou a mochila, abriu a porta, e partiu em busca de conhecimento.


quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Soneto à uma gauche

Brilhas dentro da rotina do turbilhão

Diferente, incompatível, inconcebível

Ainda sim, singular e indescritível

Um tipo heptafacetado de perfeição



Vê-se os rótulos que lhe aprisionam, eternos

Vê-se as máscaras firmemente fincadas

O rosto jovem imune a abalos externos

E o coração amargo imune a flechadas



Por um instante, a guarda jaz abaixada

A luz cruel confronta tua transparência

E surge a faísca da autenticidade



Mas vá agora e viva descompromissada!

Porque teus olhos afirmam com veemência:

És só uma criança que busca a verdade

Tons de Cinza

Uma manhã de dia nublado:

'Olha o tempo fechado'

'Nossa, verdade, está feio!'

Pausei e pus-me em devaneio



Lembrei-me do céu anil

Simples

Uniforme

Monótono

Sorri 'Viva as nuances, viva a diversidade'

Genial! Ou não... (3ª edição)

Olha só, mais uma semana que passa (hum, acho que já ouvi isso em algum lugar...) e o blog está ficando cada vez mais divertido, destaque para o texto do nosso colunista convidado, João Bernardo, e os últimos posts de Vitor Okendo. Já eu não seguirei a linha e postarei dois poemas enfadonhos e sérios. Blergh, como eu sou monótona.
Já que ninguém falou nada, cabe a mim apresentar nosso motto: "Nil est dictus facilius", literalmente "Nada é mais fácil que falar". Achamos que combinava, o que vocês achavam?
Amanhã, nossa colunista de sexta-feira, Luísa Tolhuizen, vai fazer sua estréia e estamos todos ansiosos para ler algo dela. Por favor, sejam bonzinhos e não assustem a menina. Nha, tudo bem, esquece, façam o que quiser.

Como sempre, meu vômito intelectual semanal (olha aí tua expressão favorita, Marco) inclui a frase da semana, recomendações e uma breve troca de idéias sobre algo, para quando vocês tiverem um tempo de ócio pra matar.

Nossa, entrei no Google ontem e me deparei com mais um daqueles logos de feriados (o de Halloween) e pensei o que sempre penso 'Que coisa legal'. Aliás, a Google tem uma boa coleção de logos comemorativos que eu particularmente acho maravilhosa, com datas incluindo o aniversário do Munch (12 de dezembro), do meu para sempre amado Sir Arthur Conan Doyle (que, previsivelmente, é tão geminiano quanto eu; 22 de maio) e do Louis Braille (4 de janeiro).
Aliás, falando em Conan Doyle, acho justo eu, uma pessoa que já leu toda coleção do investigador da 221B, Baker Street, escrever algo sobre os livros.
Primeiro de tudo, espero que ninguém vá me dizer que o Poirot ou a Miss Marple, por mais que eu goste dela, é melhor que o Holmes. Não consigo imaginar nenhum dos dois solucionando casos como O Cão dos Baskervilles ou Um Estudo em Vermelho ou mesmo Signo dos Quatro.
Todos são romances policiais lindos, de tirar o chapéu. Mas Doyle também tem contos menores que são simplesmente emocionantes, como A Faixa Manchada ou O Pé-Do-Diabo.
Aliás, o livro que reúne essas crônicas que tenho é quase épico. Comprei-o num sebo por 3 libras – é um livro extremamente bem tratado, de capa dura, que ao olhar descuidado, parecerá uma enciclopédia parruda. As letras douradas descrevem "Great Works of Sir Arthur Conan Doyle", junto com uns floreios que margeam a escrita. Ao ser aberto, o livro mostra suas páginas ocreadas e exala aquele cheiro característico da antigüidade. Estou até começando a achar que ele merece um poema. Mas chega, já me estendi demais.

Frase da semana:
"Qual é hoje," perguntei "cocaína ou morfina?" Ele desviou languidamente os olhos do velho volume preto que tinha aberto.
"É cocaína" disse "Uma soluçao de sete por-cento. Quer um pouco?"
(Sherlock Holmes, O Signo dos Quatro; frase original em http://en.wikiquote.org/wiki/Sherlock_Holmes, abaixo de Sign of Four)

Recomendações:

Bom, minha primeira é tão específica quanto a prova de Matemática que faço hoje. Aproveite o tempo e depois de ler a verdade dominical, i.e. a coluna do Marco, para pegar a Revista de domingo do jornal O Globo e ler a coluna da Martha Medeiros. Aliás, quero declarar publicamente minha paixão pela escrita dessa mulher, porque ela é simplesmente genial.

A outra dá menos trabalho, porque é daqui mesmo: o texto "A Quase-Galinha", de Lucas O. Mourão que, apesar de não ser metáfora nem fábula, é uma leitura agradável, descontraída e de uma certa forma provocativa: http://hipoboleconjugada.blogspot.com/2007/10/quase-galinha.html

A última da semana é para pessoas como eu, que não tem nada para fazer e são tirinhas! Sim, as últimas cinco tirinhas do Garfield estão geniais e homenageando o Halloween de ontem, então, divirtam-se:
http://www.garfield.com/comics/comics_archives_strip.html?2007-ga071030
Aliás, o site do Garfield em si é divertido, então aproveitem pra dar uma volta.

Até a próxima semana!

quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Quem me visitou? Eu?

De que serve um contador de visitas de um site? Deveria ser para que o dono do mesmo possa saber sua aceitação no universo da internet, não é mesmo?
Nessa mesma linha de raciocínio, poderíamos prever uma maior entrada do dono do site no próprio site para saber se ele é visitado com alguma freqüência.
Por causa disso alguém pensou: "Se eu vou entrar no site pra saber se alguém entrou nele, então eu terei sido uma pessoa que entrou no site! Assim, como posso saber o número de visitantes se eu acabo sendo um visitante, mas um visitante que não serve para meus cálculos de freqüência de visitantes?
Deste modo, a pessoa acima citada criou o contador de visitas de visitantes únicos para que possa entrar no próprio site sem alterar a visitação dos visitantes esperados.
Entretanto, não só de pessoas como o nosso amigo inventor que o mundo é feito e, por isso, ainda existem pessoas que usam o contador de visitas original no qual o visitante dono do site é contado como um visitante do site e cada vez que ele abre sua página tornando-se um novo visitante para o não muito inteligente contador de visitas.
Qual será o motivo para as pessoas não usarem a invenção do inventor que não queria ser contado como visitante do próprio site (afinal, ninguém visita a própria casa)? Será um modo de manipular os verdadeiros visitantes fingindo o site ser visitado por mais gente do que realmente é? Será que isso funciona?
A meu ver, poderíamos ter duas vertentes para responder a última pergunta: a primeira seria que as pessoas ficariam impressionadas pelo grande número de visitantes ao site que está visitando no momento e com isso, divulgá-lo-ia a mais pessoas, aumentando consideravelmente o número de visitantes verdadeiros. A segunda resposta seria que as pessoas são minimamente inteligentes e perceberiam que o contador de visita registra visitantes falsos, ou seja, o(s) dono(s) do site e, com isso diminuiriam seu gosto por tudo que está presente na tal página da internet com contador dos visitantes falsos.
Considerando apenas a primeira resposta, poderíamos dizer que essa é uma excelente estratégia que funciona melhor que um mapa da cidade com alfinetes coloridos para apontar alvos de possíveis leitores do site que procura leitores. No entanto, a estratégia tem um problema: Como o dono do site saberá o número real de visitantes novos que entrarão no site por causa da estratégia se o contador não conta o número real? Uma possível solução seria instalar um outro contador, sendo este outro um contador de visitantes verdadeiros.
Agora, com um segundo contador, o dono do site que quer que seus visitantes sejam contados pode saber quantas pessoas o visitam, mas como toda tese gera uma antítese, que juntas geram uma síntese, vemos que o segundo contador anularia a função do primeiro, já que as pessoas perceberiam que estão sendo enganadas e a farsa seria descoberta.
Depois de todo esse monólogo repetitivo, eu diria que tenho uma real solução para quem quer contar os visitantes do próprio site sem querer enganá-los com falsos visitantes. Esta solução é tão boa que poderia dizer que é uma síntese que dispensa qualquer tipo de antítese: Use um contador de visitas que marca cada visitante como apenas um visitante, mesmo que este entre seguidas vezes no site para parecer mais de uma pessoa.

Uma homenagem a Hipóbole Conjugada (e seu contador falso)

João Bernardo (do Blog Manifesto Metalúrgico)

terça-feira, 30 de outubro de 2007

Hipóbole se vendeu para o Grande Capital.

Na verdade, nem era tão grande assim, tava mais pra um médio capital... Bom, pra mim já é o suficiente, nunca me apeguei muito a valores ideológicos mesmo.
E isso tudo atendendo à pedidos, pois em apenas duas semanas de existência o Hipóbole recebeu mais de 400 e-mails pedindo produtos baratos para satisfazer o vazio na vida de alguns leitores. E qual a melhor maneira de preencher aquele vazio existencial do que gastando em coisas estúpidas?!
Pensando nisso nós, flagelos do sistema capitalista, vendemos muitas idéias dos diversos artigos do blog para uma empresa impiedosa fazer camisas! Isso mesmo, camisas! Vale a pena lembrar que 20% do lucro obtido na venda das camisas vai para uma instituição que ajuda as crianças que as confeccionaram.

Sem mais delongas no link logo abaixo estão as camisas originais do Hipóbole!(que não foram feitas em 5 minutos no paint, como espalham alguns boatos)

Camisas Yeah!

E é claro, com opção da cor preta para os pseudo-grunges e afins.

Longa vida ao Hipóbole $$!

Sobre Fluxo de Consciência(e algumas passagens sobre a oitava série).

Fiquei devendo um texto infame e infantil, e aqui o apresento com prazer, e dedicatórias a uma certa hóspede belo-horizontina, que me inspirou em parte a faze-lo com a seguinte frase: ''Havendo opção entre o comentário infantil e idiota e o sério e profundo, SEMPRE a primeira opção.''
Fluxo de Consciência. Sabe o que é? É uma espécie de técnica que analistas usam pra dizer que você é maluco. Também é uma técnica bastante interessante de escrita, registrada na obra de Clarice Lispector. Como funciona? Pense em um assunto. Vou te ajudar. Química. Agora é só falar tudo que vem a cabeça sobre tal assunto. Não precisa praticar isso, não agora, até onde eu sei não é saudável ficar falando sozinho.
Prova, 55, metano, etano, etil, carbono, bastão, aroma.
Isso foi o que veio a minha cabeça. É claro que Química é um assunto ligeiramente banal, e não virão muitos pensamentos mais complexos que esses citados, mas agora eu proponho outro assunto.
Oitava Série.
Babaquice. Época negra. Ridículo. Camisas pretas.14 anos.
Seus pensamentos provavelmente foram próximos a isso. Se não, pense mais a fundo.A oitava série é uma época ruim para todos. Todo mundo é babaca na oitava série. Tomando meu exemplo, por que eu sou assim, auto-centrado mesmo: Na oitava série eu era um daqueles metaleiros malvadões, camisa preta, ouvindo bandas pesadas, ouvia Metallica e achava que era a coisa mais brutal. Dava tudo pra ter algum pingente de pentagrama, falava que eu era filho de satã e queria queimar igrejas. Hoje em dia eu sou cristão.
Tá meu caso é extremo, mas citemos algum outro, também sou assim, gosto de difamar, e esse eu faço questão de cantar o santo. Marco Sá. O cara de dois posts abaixo se lembra? Conto do diplomata? Poema sujo? Pois é. Eu tive o inenarrável prazer de conhecê-lo durante o período oitaviano. Ele não era esse intelectual pernóico que alegra nossos domingos. Longe disso. Era um anarco-punk sindicalista, seja lá o que fosse isso. Só ouvia as bandas mais undergrounds que desafiavam o sistema, com aquele característico ‘’A’’ da anarquia, e é claro, seguindo o padrão das camisas pretas. Pois é, o nome disso é oitava série.
Passei por uma pesquisa intensiva essa semana para saber sobre o tal período, e se minha tese estava certa, segue aqui alguns trechos de entrevistas que eu fiz e, até onde a memória vai, retratadas exatamente da maneira com que foram ditas.
‘’Putz! Oitava série! Eu era um babaca! Era meio pseudo-grunge saca? Camisa de flanela, muito nirvana...’’
’’Fiquei tão traumatizado que hoje em dia nem passo mais na frente de uma sala de oitava.’’
’’Eu ficava pesquisando sobre bandas underground, quanto mais tosco melhor, só vinha lixo, eu achava o máximo hahaha.’’
Alguém pode questionar: ‘’Mas Vitor! As pessoas são assim por que 14 anos é uma idade propensa a esses distúrbios de comportamento e a essa imaturidade!’’. Não. Não. Não! Tá errado! É assim por que é a oitava série! Tem toda uma mística relacionada à série. Alguém pode reprovar 4 vezes a oitava série, cursa-la com 18 anos, que vai continuar a mesma pessoa de 4 anos atrás. Mais exemplos para a tese:
A garota dessa foto: provavelmnete ela tirou essa foto na oitava série. O que será dela hoje? Provavelmente cursando história, ou direito, quer seguir a carreira acadêmica, não sei.
Esse grupo de jovens provavelmente juntaram essa banda para tocarem no sarau de formatura da oitava série. Imagino que hoje em dia o da direita seja graduado em ciências atuariais, o do meio um pai honesto de família, com dois filhos saudáveis, o cabeludo sombrio da esquerda é veterinário, aposto.
Já estou me estendendo nesse assunto ridículo a muito tempo, só tenho o intuito de provar minha tese. Oitava série é o período mais negro de todos. Mas antes de fechar, queria lembrar algo curioso. Ano passado, foi aprovada uma lei que cria uma nova série, a nona, e para não atrasar a vida dos alunos, todos pularam uma série para se adaptar ao novo sistema. Isso mesmo, o que estavam na sétima, que deveriam ir para a oitava, pularam direto para a nona. Pularam. A Época negra. O momento ruim. Sortudos.

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Pano Velho

Esse pano velho
Tantas vezes remendado
heterogêneo, um pouco esgarçado
Esse pano já sem cor, sem vida;
Neste pano que veste duas almas
estão inscrustados pequenos diamantes
pequenas sobras de felicidade
alguns vestígios de trsiteza...
Esse pano
que não se sabe ao certo o que é:
Uma blusa, um casaco, um vestido;
Um pano informe...
Apenas velho. Um pouco encardido;
Pano imaterial, insólito, reluzente
Pano que depois de algum tempo
foi esquecido, perdeu sua força
Esse torto a
m
o
r
Que não veste, não cobra, não completa
Se limita. Existe.

Justificativa...

Na verdade esse perágrafo é só para aqueles que esperavam algo meu óntem(assim como fazem com todos os colunistas). Tive um surto e apaguei durante 9hs após a chegada do colégio na segunda...enfim...o texto estava pronto mas não o enviei...na verdade é um humilde poema que escrevi numa das "rodas-vivas" da minha vida. Espero compartilhar com todos esta experiência e que cada um atribua ao mesmo sua própria interpretação. Afinal, pra que serve a Literatura?

domingo, 28 de outubro de 2007

A entrevista (do anedotário diplomático)

Diplomata em início de carreira, havia sido escalado para sua primeira representação em um consulado de relativa importância, o de Roterdã. Logo após a apresentação de credenciais, foi convidado a dar uma entrevista a um dos mais importantes jornais da cidade, como o definiu a representante do periódico. Talvez por inexperiência, talvez na tentativa de mostrar polidez, logo aceitou, sendo marcado o encontro para o dia seguinte em seu escritório.
Perguntou-se o porquê de um jornal de renome demonstrar interesse em um terceiro-secretário recém-chegado ao país. Uma rápida pesquisa, no entanto, teria o feito descobrir a fama de menos escrupuloso tablóide do país que aquele possuía. Já os editores do folhetim, não se importavam com o fato de não ser importante o entrevistado. “Apresentaremos ele como cônsul brasileiro. Vocês sabem que diplomata é sempre visto como importante; e nossos leitores adoram matérias sobre países como o Brasil” foi o argumento utilizado pela idealizadora da matéria para garantir que fosse aprovada.
Na data marcada, chegou a repórter à casa do brasileiro, com um atraso de quarenta minutos. “Não estou na Suíça ou na Inglaterra, era de se esperar...”, pensou. Estranhou, é verdade, o rosto amassado de quem levanta da cama e a maneira largada de se vestir da jovem repórter, “mas e daí? Jornalistas são assim mesmo, e os holandeses são famosos por serem liberais”. Aperto de mãos, bloco em punho, máquina gravando. Poderia ter início a entrevista.
Seguiu-se uma série de perguntas a respeito do país do entrevistado. As praias, o futebol, a caipirinha, o povo, as mulheres, enfim, vários eram os assuntos, mesmo que nenhum diretamente relacionado a política internacional. Questionou-se sobre a razão de tudo aquilo, afinal não poderia falar sobre os planos do Brasil para a região ou apresentar o festival de cultura brasileira que viria a ocorrer na semana seguinte.
Em seguida, houve perguntas sobre a prática da diplomacia. Não que fossem relevantes, ou ao menos interessantes; na verdade pareciam ser feitas para a coluna social. Mas, pensando bem, não tratavam de estereótipos de seu país-natal. A certa altura defrontou-se com uma pergunta que mudaria a história daquela entrevista.
-Senhor cônsul-ela insistia em chamá-lo assim -como você lida com aqueles diplomatas que insistem em gastar seu tempo com intermináveis conversas?
-Interessante pergunta... Quando a fizeram a Bismarck, ele disse que pedia a um funcionário que interrompesse dizendo que sua mulher tinha algo importante a dizer.
“Uma boa resposta”, orgulhou-se. E ainda deu-lhe uma idéia. A isso procederam diversas perguntas sobre os Países Baixos. Deveria ter melhor se preparado antes de assumir o cargo. De qualquer maneira, não havia como estar preparado para a pergunta seguinte, que viria a ser a última.
-O que o senhor acha sobre os famosos prostíbulos holandeses?
-Há prostíbulos por aqui?- perguntou assustado.
Tão desagradável situação viria a ser interrompida por uma secretária do consulado, que vinha lembrar de uma importante reunião. Incomodada pela repentina interrupção, a jornalista se despediu com a sensação de que havia sido enganada.No dia seguinte, todas as bancas de jornal holandesas avisavam aos que passavam, em letras garrafais: RECÉM-CHEGADO, CÔNSUL BRASILEIRO PERGUNTA SOBRE OS PROSTÍBULOS HOLANDESES.

Nizza

(Em resposta ao desafio proposto pela Luíza na quinta-feira, não vou escrever um texto longo como ela fez; apenas postarei meu poema-resposta com métrica e rimas)

À vista de tais três listras que, expostas,
Estavam ante a vitrine transluzente,
O prazer daqueles que encontram respostas
Foi o que senti e também toda gente.

Teria o feito enamorado artesão?
Ou máquinas de uma linha de montagem?
Um argentino, que pr’a garantir o seu pão,
Trabalha pr'o burguês que tira vantagem.

E o verde do pano lembrava a floresta,
O que não fazia, no entanto, sua sola
Cuja borracha era, sabemos, sintética.

Tão belas costuras, com padrão cosidas.
Perfeita és a linha que envolve tal obra
De arte que vejo, meus tênis Adidas

Duas semanas que passam

_Já mais que uma vez perguntaram o que significa hipóbole. Até semana passada eu também não sabia, era só um neologismo nosso, mas descobriram um significado para ela: Refutação antecipada de objeções, sinônimo de silepse (créditos a Antônio Sá). Em nossa concepção, hipóbole também era uma figura de linguagem, mas consistia numa variação de hipérbole em que o exagero é negativo.
_Saúdo nosso mais novo concorrente, o Manifesto Metalúrgico. Desejo boa sorte a eles com suas estratégias para roubar nossos leitores, seus mapas e seus alfinetes coloridos. Um blog de e para pedreiros, como eles mesmos dizem. Espero desde já sua série de poesia concreta.
_Por que não levam essa tal de Cow Parade para a Índia? Afinal, já há muito não ocorre um festival de arte sacra por lá.
_ Até mais, e boa sorte aos que fazem PUC quinta-feira. Preparem-se, pois semana que vem o Hipóbole Conjugada estreará algo inédito em matéria de blogs.

sábado, 27 de outubro de 2007

A Quase-galinha

A Quase-galinha



Tinha a memória curta.Vivia, disso sabia.Mas,… o que era mesmo que ela sabia?…Se esquecia tão rápido,talvez por isso não aprendesse...Mas de que importa a ela saber das verdades (ou mentiras) do mundo?Afinal, está aprisionada.Seu campo de visão é limitado,sua comida é seca e insossa,sua água tem gosto de cloro,sua percepção é confusa.Mas nada disso a faz sofrer.
Quem dera todos nós pudéssemos aprender a ser gratos pelo que temos, pacientes e persistentes como ela.Se você lê isso em uma tela de computador, infelizmente, está minimamente anestesiado.Dificilmente reflete sobre o valor desse privilégio, e de tantos outros.Se você não se sente grato pelo que sua liberdade lhe dá acesso, não possuí dimensão dos abismos de que foi poupado.
Mas voltemos a ela.Era anômala.Causava estranhamento, mas nem por isso era infeliz.Uma Quase-galinha.Nem grande demais, a ponto de ter o volume de uma galinha, nem pequena de menos, para ter o corpo de uma sabiá.O dono garantia se tratar de uma sabiá saudável, e por isso Geraldo a comprou.Mas quando chegou em casa: a gaiola era pequena de mais.Mas que se há de fazer?Ela continuou habitando a mesma gaiola,por dias e noites.As opções eram limitadas:comer, beber água, olhar pra um lado e pro outro,dar dois passos, quase-abrir as asas, dormir. “E no dia seguinte?” Mas que dia seguinte o quê?Não se lembra que ela não se lembra?Nunca havia dia seguinte.Era sempre o agora.Talvez por isso sofresse menos, mas só talvez...
Se fosse humana ia começar a se incomodar com as gorduras que se acumulavam, devido à sua precária atividade física.Mas era uma Quase-galinha, e nada a incomodava.Não percebia que crescia a cada dia que passava, e seus movimentos eram cada vez mais limitados.Era sempre o agora: “Oh, que lindo verde à minha frente, que lindo azul”. E 2 segundos depois: “Oh, que lindo verde à minha frente, que lindo azul”.Existia.E por ser única, tinha a sua beleza aos que a observavam.
Mas um dia...Por descuido o dono deixou a trava da portinhola da gaiola aberta.Um sopro de vento, e a liberdade sugava com seus tentáculos a Quase-galinha.Saiu.Sem ser vista ainda por cima!Voou para o galho mais próximo, e ficou fazendo o que sabia fazer: nada.O dono chegou, ficou aflito.Começou a caçada pela nossa heroína.
Inacreditável!Quase-galinha 1 X 0 Geraldo .
Ficou abatido pelo cansaço, desistiu.Como voava para um pássaro tão gordo.E ela voltou ao galho.Parada.Parada.Parada.Parada.Parada.“O que será aquela caixa de metal vazada?” Parada.Parada.Parada “Quem é aquele homem ofegante”.Parada. “Fome” Parada.Parada.Parada.Parada. “Hum!Comida na caixa vazada!” Voou de volta.Geraldo correu, conseguiu trancá-la.E ela? Nem teve tempo de se lamentar,esqueceu.Estava era feliz em saciar sua fome.
Talvez o leitor esteja triste pela Quase-galinha.Mas talvez a liberdade fosse grandiosa de mais para ela.Se servir de consolo, pense que ela já esqueceu.


Lucas O. Mourão