domingo, 28 de outubro de 2007

A entrevista (do anedotário diplomático)

Diplomata em início de carreira, havia sido escalado para sua primeira representação em um consulado de relativa importância, o de Roterdã. Logo após a apresentação de credenciais, foi convidado a dar uma entrevista a um dos mais importantes jornais da cidade, como o definiu a representante do periódico. Talvez por inexperiência, talvez na tentativa de mostrar polidez, logo aceitou, sendo marcado o encontro para o dia seguinte em seu escritório.
Perguntou-se o porquê de um jornal de renome demonstrar interesse em um terceiro-secretário recém-chegado ao país. Uma rápida pesquisa, no entanto, teria o feito descobrir a fama de menos escrupuloso tablóide do país que aquele possuía. Já os editores do folhetim, não se importavam com o fato de não ser importante o entrevistado. “Apresentaremos ele como cônsul brasileiro. Vocês sabem que diplomata é sempre visto como importante; e nossos leitores adoram matérias sobre países como o Brasil” foi o argumento utilizado pela idealizadora da matéria para garantir que fosse aprovada.
Na data marcada, chegou a repórter à casa do brasileiro, com um atraso de quarenta minutos. “Não estou na Suíça ou na Inglaterra, era de se esperar...”, pensou. Estranhou, é verdade, o rosto amassado de quem levanta da cama e a maneira largada de se vestir da jovem repórter, “mas e daí? Jornalistas são assim mesmo, e os holandeses são famosos por serem liberais”. Aperto de mãos, bloco em punho, máquina gravando. Poderia ter início a entrevista.
Seguiu-se uma série de perguntas a respeito do país do entrevistado. As praias, o futebol, a caipirinha, o povo, as mulheres, enfim, vários eram os assuntos, mesmo que nenhum diretamente relacionado a política internacional. Questionou-se sobre a razão de tudo aquilo, afinal não poderia falar sobre os planos do Brasil para a região ou apresentar o festival de cultura brasileira que viria a ocorrer na semana seguinte.
Em seguida, houve perguntas sobre a prática da diplomacia. Não que fossem relevantes, ou ao menos interessantes; na verdade pareciam ser feitas para a coluna social. Mas, pensando bem, não tratavam de estereótipos de seu país-natal. A certa altura defrontou-se com uma pergunta que mudaria a história daquela entrevista.
-Senhor cônsul-ela insistia em chamá-lo assim -como você lida com aqueles diplomatas que insistem em gastar seu tempo com intermináveis conversas?
-Interessante pergunta... Quando a fizeram a Bismarck, ele disse que pedia a um funcionário que interrompesse dizendo que sua mulher tinha algo importante a dizer.
“Uma boa resposta”, orgulhou-se. E ainda deu-lhe uma idéia. A isso procederam diversas perguntas sobre os Países Baixos. Deveria ter melhor se preparado antes de assumir o cargo. De qualquer maneira, não havia como estar preparado para a pergunta seguinte, que viria a ser a última.
-O que o senhor acha sobre os famosos prostíbulos holandeses?
-Há prostíbulos por aqui?- perguntou assustado.
Tão desagradável situação viria a ser interrompida por uma secretária do consulado, que vinha lembrar de uma importante reunião. Incomodada pela repentina interrupção, a jornalista se despediu com a sensação de que havia sido enganada.No dia seguinte, todas as bancas de jornal holandesas avisavam aos que passavam, em letras garrafais: RECÉM-CHEGADO, CÔNSUL BRASILEIRO PERGUNTA SOBRE OS PROSTÍBULOS HOLANDESES.

Nizza

(Em resposta ao desafio proposto pela Luíza na quinta-feira, não vou escrever um texto longo como ela fez; apenas postarei meu poema-resposta com métrica e rimas)

À vista de tais três listras que, expostas,
Estavam ante a vitrine transluzente,
O prazer daqueles que encontram respostas
Foi o que senti e também toda gente.

Teria o feito enamorado artesão?
Ou máquinas de uma linha de montagem?
Um argentino, que pr’a garantir o seu pão,
Trabalha pr'o burguês que tira vantagem.

E o verde do pano lembrava a floresta,
O que não fazia, no entanto, sua sola
Cuja borracha era, sabemos, sintética.

Tão belas costuras, com padrão cosidas.
Perfeita és a linha que envolve tal obra
De arte que vejo, meus tênis Adidas

Duas semanas que passam

_Já mais que uma vez perguntaram o que significa hipóbole. Até semana passada eu também não sabia, era só um neologismo nosso, mas descobriram um significado para ela: Refutação antecipada de objeções, sinônimo de silepse (créditos a Antônio Sá). Em nossa concepção, hipóbole também era uma figura de linguagem, mas consistia numa variação de hipérbole em que o exagero é negativo.
_Saúdo nosso mais novo concorrente, o Manifesto Metalúrgico. Desejo boa sorte a eles com suas estratégias para roubar nossos leitores, seus mapas e seus alfinetes coloridos. Um blog de e para pedreiros, como eles mesmos dizem. Espero desde já sua série de poesia concreta.
_Por que não levam essa tal de Cow Parade para a Índia? Afinal, já há muito não ocorre um festival de arte sacra por lá.
_ Até mais, e boa sorte aos que fazem PUC quinta-feira. Preparem-se, pois semana que vem o Hipóbole Conjugada estreará algo inédito em matéria de blogs.